Petição Inicial - Ministério Público

Petição Inicial do Ministério Público 


Exmo. Senhor Juiz de Direito
Do Tribunal Administrativo de Círculo de
LISBOA.

O MINISTÉRIO PÚBLICO, sito na Rua da Escola Politécnica n.º 140, 1269-269 Lisboa, representado pelo Procurador Geral da República, Dr. (XXX), e pelo Procurador da República, Dr. (XXX)
Vem, nos termos do artigo 219º/1 da Constituição da República Portuguesa e dos artigos 1º e 3º/1 alínea e) do Estatuto do Ministério Público, bem como do artigo 51º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, intentar uma ação administrativa de impugnação de atos administrativos, nos termos do artigo 37º/1 alínea a) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).

Contra 

Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo
, Pessoa Coletiva de Direito Público nº 123547896, sita na Rua Y, 1200-345 Lisboa, (artigo 10º/2 1ª parte do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), Luís Cunha e Cunha, casado, portador do cartão de cidadão com o número de identificação civil 45756714, contribuinte fiscal 237220334, residente na Rua X, nº78, 1200-475 Lisboa, na qualidade de Presidente da Administração Regional da Saúde (artigo 10º/9 do CPTA), e “3x9=27Farma”, Pessoa Coletiva nº98785789, sita na Rua L nº77, 1200-454 Lisboa, na qualidade de contrainteressado (artigo 10º/1 2ª parte e artigo 57º ambos do CPTA).



I – Questões prévias 

1.1 Da competência do Tribunal 

1º 
A presente acção visa a impugnação do acto administrativo de adjudicação, em resultado de concurso público, da aquisição de plasma inactivado à empresa farmacêutica “3x9=27Farma”, por parte da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, apreciar da validade do contrato subsequente, bem como aferir eventuais responsabilidades de Luís Cunha e Cunha, presidente da referida Administração Regional de Saúde.

O presente litígio insere-se no âmbito da jurisdição administrativa, nos termos do artigo 4º/1 alíneas b), e) e g) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF).
Em razão da hierarquia, determina-se a competência de carácter residual dos Tribunais Administrativos de Círculo para conhecer, em 1ª instância, de todos os processos do âmbito da jurisdição administrativa, por força do artigo 44º/1 do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, bem como por via da sua não inserção nem na competência do Supremo Tribunal Administrativo prevista no artigo 24º, nem na competência dos Tribunais Centrais Administrativos prevista no artigo 37º do mesmo diploma.

4º 
Resulta da conjugação do artigo 3º do Decreto-Lei nº 325/2003 com o artigo 16º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos que, em razão do território, compete ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa julgar a causa.

Não existindo diversidade de tribunais competentes para os diferentes pedidos em apreciação, está afastado o âmbito de aplicação do artigo 21º/2 do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA); no mesmo sentido, se exclui, também, a aplicação do artigo 20º/1 do referido diploma, uma vez que a Administração Regional de Saúde é uma entidade tutelada pelo Estado; além do mais, como o objetivo do caso sub judice é a impugnação de um ato administrativo pré-contratual (ato de adjudicação), enquadrado no procedimento da formação do contrato, não se tratando de uma questão de interpretação, validade e/ou execução de contratos (37º/1 alínea l) do Código do Processo nos Tribunais Administrativos), aferimos a referida competência pelos preceitos do artigo 16º, e não pelo artigo 19º do citado diploma. 

Em razão da matéria, cabe aos Tribunais Administrativos apreciar o mérito da causa.


1.2. Da legitimidade 

7º 

No propósito da defesa da legalidade democrática e promoção da realização do interesse público (Artigo 51º ETAF), o Ministério Público, nos termos do Artigo 55º/1, alínea b) do CPTA, pode impugnar todo e qualquer ato administrativo, legitimando-se desta forma a sua intervenção.



II - Dos factos

Luís Cunha e Cunha é presidente do Instituto Nacional de Emergência Médica e da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo.

Luís Cunha e Cunha foi presidente do júri de um concurso público, organizado pela Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo.

10º
O concurso público, visava selecionar o fornecedor de plasma inativo, para a consequente celebração do contrato de aquisição desse mesmo plasma por parte da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo.

11º 
Plasma Inativo é um componente do sangue que é utilizado essencialmente em doentes hemofílicos, para pessoas infetadas com o vírus do VIH, bem como para doentes de cancro e para os que sofreram queimaduras graves. 

12º
Luís Cunha e Cunha utilizou e abusou do seu poder enquanto presidente da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, de modo a ser presidente do júri do concurso público em questão, e assim exercer maior influência na decisão da contratação.

13º
Em consequência do referido concurso, foi contratada a empresa “3x9=27Farma”, que ficou responsável pelo fornecimento exclusivo de plasma inativo para o mercado hospitalar da Grande Lisboa.  


14º
 Luís Cunha e Cunha, terá sido corrompido com vários automóveis, a oferta de uma moradia habitacional e ainda elevados montantes em numerário.

15º 
Em consequência da contratação supra referida, verificou-se um aumento dos preços pagos pelos destinatários de plasma inativo. 


III – Do Direito 

16º

Concretizando o âmbito de jurisdição dos Tribunais Administrativos, uma vez que a Administração Regional da Saúde de Lisboa e Vale do Tejo é um Instituto Público integra-se  na Administração Pública do Estado, compete aos tribunais administrativos, nos termos do artigo 4º/1 alínea b) do ETAF, fiscalizar a legalidade do ato jurídico emanado pela Administração Regional da Saúde de Lisboa e Vale do Tejo.

17º 
No que concerne à alínea e) do artigo 4º/1 do ETAF, revela-se necessário explicitar que estamos perante um contrato administrativo, pois uma vez que, conjugando o disposto no artigo 2º/1 alínea d) com o artigo 3º/1 alínea a) do Código dos Contratos Públicos (CCP), a Administração Regional de Saúde  de Lisboa e Vale do Tejo é considerada um contraente público. Assim sendo, de acordo com o artigo 278º do mesmo diploma, esta pode, na prossecução das suas atribuições ou dos seus fins, celebrar quaisquer contratos administrativos. Estando o contrato em questão submetido às regras procedimentais de formação de direito administrativo, as questões relativas ao mesmo devem ser suscitadas perante os tribunais administrativos. 

18º
Estando em causa uma atuação do presidente da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, Luís Cunha e Cunha, no exercício dos seus poderes e funções, enquadra-se tal situação no âmbito da alínea g) do artigo 4º/1 do ETAF. 

19º
A impugnação de um ato administrativo tem por objeto a declaração de nulidade ou anulação, de acordo com artigo 50º/1 do CPTA.  No caso, estando em causa um ato praticado com preterição do fim legal, uma vez que Luís Cunha e Cunha decidiu contratar com a farmacêutica tendo por base não um interesse público, mas sim um interesse privado. Tendo em conta a gravidade absoluta do ato, estamos perante um crime de corrupção, e nessa medida, do ponto de vista jurídico-administrativo, nos termos do artigo 161º/2 alínea e) do Código do Procedimento Administrativo (CPA), o ato padece de nulidade.

20º
Tratando-se de um ato nulo, este é ineficaz desde o início, e nos termos do artigo 162º/2 do CPA e artigo 58º/1 do CPTA, a nulidade pode ser invocada a todo o tempo por qualquer interessado.

21º
Considerando que o ato pré-contratual é nulo, de acordo com o artigo 283º/1 do CCP o contrato celebrado ao abrigo deste ato é consequentemente nulo.

22º
Cumpre ainda na ação administrativa, aferir da responsabilidade civil extracontratual, nos termos do artigo 37º/1 alínea k) do CPTA, e dos sujeitos sobre a qual esta recai.

23º 
Em relação à Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, por força do artigo 22º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 7º/1 da Lei nº 67º/2007, de 21 de dezembro será esta responsável pelas atuações dos titulares dos seus órgãos, no caso, pelas atuações de Luís Cunha e Cunha enquanto presidente.  



IV – Do pedido

Nestes termos, e nos melhores de Direito, atendendo ao exposto deverá o presente pedido ser julgado procedente, por provado e em consequência:
- Declarar a nulidade do ato de adjudicação;
- Declarar consequentemente a nulidade do contrato de aquisição de plasma inativo;
- E ainda, aferir das devidas responsabilidades, condenando a Administração Regional da Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e Luís Cunha e Cunha ao pagamento de uma indemnização.



V – Da prova

1. Documental
- Contrato de Doação de uma moradia habitacional, celebrado entre a empresa “3x9027Farma” e Luís Cunha e Cunha, a doação em causa foi efetuada antes da data do referido concurso.
- Comprovativo de transação bancária efetuada pela empresa “3x9=27Farma” para uma conta bancária secundária de Luís Cunha e Cunha, igualmente efetuada antes da data do concurso público.

2. Testemunhal (artigos 498º e 511º do CPC)
Indica-se a seguinte testemunha a notificar:
- Abel Martins, trabalhador no Stand de automóveis da Maserati, casado, portador do cartão de cidadão com o número de identificação civil 45789715, contribuinte fiscal 277250324, residente na Rua Z, nº78, 1200-405 Lisboa.



VI – Do valor da causa

O valor da causa determina-se pelo regime que consta dos artigos 31º e seguintes do CPTA.
Relativamente ao pedido de impugnação do ato de adjudicação, atenda-se ao artigo 32º/2 do CPTA, na medida em que se trata da adjudicação de um contrato administrativo, o seu valor irá corresponder ao valor do contrato a adjudicar, que por sua vez equivale ao valor de €40.000.000 (quarenta milhões de euros).
No que respeita ao pedido de apreciação da validade do contrato, nos termos do artigo 32º/3 do CPTA, o valor da causa é determinado pelo valor do contrato, ou seja, €40.000.000 (quarenta milhões de euros).
Por último, quanto ao pedido de responsabilidade civil extracontratual, visando-se obter o pagamento de quantia certa por parte da Administração Regional da Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e de Luís Cunha e Cunha, e conforme o previsto no artigo 32º/1 do CPTA, o valor da causa é €50.748,32 (cinquenta mil setecentos e quarenta e oito e trinta e dois cêntimos).
Tratando-se de uma cumulação de pedidos, nos termos do artigo 32º/7 do CPTA, o valor da causa será equivalente à soma dos valores de todos os pedidos, ou seja, €80.050.748,32 (oitenta milhões cinquenta mil e setecentos e quarenta e oito e trinta e dois cêntimos).


Anexos

De acordo com o Artigo 78º/4 CPTA apensa-se os seguintes documentos, como prova:

- Contrato de Doação de uma moradia para habitação
- Comprovativo de transação bancária


Petição Inicial realizada por:
Aline Lourenço
Jorge de Paiva
Mafalda Garcia
Matilde Correia de Sá


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