Deveremos exigir uma disponibilidade absoluta como critério no seio da arbitragem de litígios administrativos?



No âmbito da arbitragem de litígios administrativos, importa analisar em que medida o critério da disponibilidade é referente a uma disponibilidade absoluta ou relativa.

A grande questão que se impõe, neste sentido, é a de saber se consoante o critério de disponibilidade contido na arbitragem de litígios administrativos, deve ser uma disponibilidade absoluta ou, pelo contrário, apenas uma disponibilidade relativa.

Desde já, importa referir que se torna complexo encontrar um critério que seja neutro, no âmbito da arbitragem, nas relações jurídico-administrativas. A disponibilidade torna-se um critério complicado de execução.

Começando por eludir a este critério, este é um pressuposto da arbitrabilidade administrativa e por isso deve-se atender a um caminho de compreensão sobre se deveria ser, ou não, absoluta ou apenas relativa.

Neste sentido, o artigo 1º, nº1 da LAV diz-nos que são arbitráveis quaisquer litígios respeitantes a direitos patrimoniais, independentemente de se tratar de matéria disponível ou indisponível.  Já o artigo 180º CPTA permite a arbitragem em matéria que, antigamente, seria considerada como indisponível. Agora, concorda-se que um tribunal arbitral anule ou declare nulos os atos administrativos relativos, a por exemplo, execução de contratos, o que, no meu entender, transparece uma desaplicação do critério da disponibilidade.

A questão que impera, neste sentido, é saber se de facto basta um critério de disponibilidade relativo ou se será necessário um critério totalmente absoluto.

Mediante o que anteriormente foi mencionado, cabe agora enunciar a minha perspetiva sobre o tema. Assim sendo, ao ser uma disponibilidade absoluta estaríamos a limitar demasiado o âmbito das matérias suscetíveis de arbitragem, isto porque, há direitos que em todas as situações não devem ser vedados a submissão à arbitragem de litígios que digam respeito a esses mesmo direitos. Exemplo disto serão os direitos de carácter patrimonial, em que não devemos travar o acesso à arbitragem, uma vez que esta tem por sua vantagem a rapidez de resolução deste tipo de litígios. Assim, deveremos então apostar numa disponibilidade dita relativa? Em minha opinião considero que se fossemos abordar este sentido do critério era apenas bastante que um só direito, mesmo que ele indisponível na maioria das suas situações ou em relação à grande maioria que o pudessem atingir, pudesse então ser objeto de uma disposição por parte do seu titular em relação a uma dessas situações, para que se conclua pela sujeição à arbitragem. Pensamos nos exemplos que o professor Castro Mendes dá sobre matérias que podem apresentar uma qualquer forma de disponibilidade, pensamos então as matérias relativas ao estado civil das pessoas, o facto de passarmos a admitir a arbitragem de litígios relativos a direitos que apresentem uma qualquer forma de arbitragem, como sucede com este exemplo, seria tornar arbitráveis este tipo de matérias, o que não seria aceitável.

Os problemas suscitados pela aplicação do critério da disponibilidade do direito são demonstradas através de um caso decidido em 2005 pelos tribunais superiores portugueses, em que no acórdão proferido em 16/02/2005 pelo Tribunal da Relação de Guimarães, declarou a nulidade de uma cláusula de arbitragem contida num contrato de distribuição celebrado entre duas empresas portuguesas, que referia que quaisquer fossem os litígios quanto à interpretação ou execução do contrato seriam dirimidos por três árbitros, consoante o Regulamento do Tribunal Arbitral da Camara de Comércio Internacional de Lisboa.  Entendeu a Relação que na parte da resolução de litígios com base em direitos indisponíveis que competia a árbitros, julgando eles segundo um juízo de equidade, a cláusula arbitral era nula. Esta decisão parece ir ao encontro da definição que se encontra no artigo 1º, nº1 da LAV sobre o critério da disponibilidade.

Concluindo, considero que o critério da disponibilidade no âmbito de matérias jurídico-administrativas deveria ser de carater relativo, pelo que se fossemos recorrer à absolutidade corríamos o risco de demarcar em excesso o âmbito de matérias suscetíveis à arbitragem.







Bibliografia:


- Lima Pinheiro, Luís de, Arbitragem Transnacional – A Determinação do Estatuto da Arbitragem, Almedina, Coimbra, 2005

- Aroso de Almeida, Mário, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2013

- Aroso de Almeida, Mário, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 3ª edição revista, 2010

- Esquível, José Luís, Os Contratos Administrativos e a Arbitragem, Almedina, 2004

- Acórdão da Relação de Guimarães de 16/02/2005



Autoria: Maria Ramos Roque, Nº57124, 4º Ano, Subturma 7 

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