A problemática
imposta pela proibição de executar o acto administrativo.
Cabe, antes demais, enunciar
aquilo que está em causa quando falamos da proibição de executar o acto
administrativo a pedido do interessado, ou seja, da parte activa, quando vê que
perante a lesão a que se encontra sujeita, decorrente do acto praticado pela
Administração, submete uma providência cautelar de forma a que o acto praticado
por esta cesse durante a pendência do processo principal.
No entanto, e como tem sido
apontado pela jurisprudência, e bem, nos sucessivos processos cautelares, em
que este instrumento processual administrativo, teve lugar, nos termos do nº1
do art. 128.º do CPTA, ele só pode operar, em sede de processo cautelar, desde
que esteja devidamente fundamentado, como resulta do próprio art. 128.º/1 in
fine, e sem que, para tal, ponha em causa, e de forma gravosa, a
prossecução do interesse público, caso contrário esta suspensão torna-se
ineficaz, pois no entender da jurisprudência que tem sido seguida, toda a cessação
da eficácia de actos administrativos é, em geral, prejudicial na prossecução do
interesse público, daí resultante a excecionalidade desta providência cautelar.
Tanto no entender do professor
Mário Aroso de Almeida bem como da actual jurisprudência, tal instrumento não
deve ser banalizado sob o risco de por sistematicamente em causa ao interesse
público. Mas acrescento mais, aquilo que está em causa não é só a salvaguarda
do interesse público mas também a salvaguarda dos interesses privados, seja do próprio
requerido, seja dos interessados e dos contrainteressados que para todos os
efeitos, e por não se encontrarem, estes dois últimos, numa relação
controvertida com o requerente, porque muitas vezes, a suspensão da execução
dos atos administrativos põe em causa o dia á dia de sujeitos individuais que
muitas vezes não temos conhecimento, seja porque as suas vidas profissionais
dependem que tais actos continuem em execução, seja porque dependem deles para
poder dar inicio a outro tipo de actos, alguns deles, inclusive, de natureza jurídica,
não podem ficar reféns de situações de autêntico “limbo” processual ao nível do
contencioso administrativo.
Nem a revisão de 2015 ao CPTA,
nem a actual revisão, nos termos da lei nº 118/2019 de 17 de setembro vem
colmatar este problema que teima, por força do legislador, em continuar. O
professor Mário Aroso de Almeida crítica precisamente a solução que se encontra
propugnada no nº4 do art. 128.º do CPTA, apelidando-a de «A solução enferma de
evidentes insuficiências.».
O facto de o interessado, nada
poder fazer nestas situações porque o legislador não permite ao interessado, em
sede declarativa, impugnar as fundamentações que o requerente apresentou para a
suspensão da execução do acto administrativo, faz com que, só depois de ela ter
sido objecto de execução é que é permitido ao interessado reagir.
É precisamente aqui, no
seguimento desta fragilidade que não foi revista em 2015, nem em 2019, que nos
surge um problema ainda mais grave e que nos permite perceber as delimitações
da legitimidade passiva na impugnação de actos administrativos, neste caso,
naquilo a que aos contrainteressados diz respeito nos termos do art. 57.º por
força do art. 10.º/1 do CPTA, pelo o facto de existir e bem, tal como acontece para
a legitimidade activa nos termos do art. 55.º por força do art. 9.º/1, um
conjunto de requisitos que devem ser preenchidos para o sujeito particular,
seja ele singular ou colectivo, possa ser parte da relação controvertida.
Isto porque nas situações quotidianas,
acima mencionadas, quando o interesse público não seja o mesmo que é perfilhado
pelos contrainteressados, e o interesse do requerente, que pediu a suspensão da
execução do acto administrativo, esteja mais próximo daquele que é considerado
o interesse público, ficamos numa situação periclitante, pelo facto de, os
interesses dos contrainteressados e dos beneficiários não se encontrarem
resguardados no nº1 do art. 128.º. Veja-se, aliás, a força que é atribuída ao
nº2 mesmo artigo para prosseguir, de forma urgente, à suspensão de quaisquer
actos que se encontravam a decorrer por força do acto administrativo que é
agora suspenso dela Administração, sem que muitas das vezes os contrainteressados
tenham conhecimento das razões que levaram a que a norma que se encontrava em
execução tivesse sido suspendida.
É por estas razões que
considero ser importante uma análise mais atenta ao alcance do art. 57.º, no
que respeita, exclusivamente aos problemas levantados pelo art. 128.º, e se possível,
uma nova revisão do art. 128.º, uma vez que os problemas que foram suscitados tanto
pelo professor Vieira de Andrade, como pelo professor Mário Aroso de Almeida e
restante doutrina, bem como pela maioria da jurisprudência, que tem conseguido
controlar a tentação dos requerentes destas providências, impedindo a sua
banalização, através de uma interpretação bastante restritiva do artigo, uma
vez que “trauma de infância” teima em persistir.
Tomás
Lopes, Nº 26703
Bibliografia
consultada:
ALMEIDA, Mário Aroso de. Manual de Processo
Administrativo. Coimbra: Almedina, 2017, 3ª edição, cit., pp. 442-451;
SILVA, Vasco Pereira da. O Contencioso Administrativo
no Divã da Psicanálise - Ensaio sobre as Acções no Novo Processo Administrativo. Coibra:
Almedina, 2016, reimpressão da 2ª edição de 2009;
ANDRADE, José Carlos Vieira de. Justiça Administrativa.
Almedina, 2017, 16ª edição, cit., p. 310;
Acórdãos do TCA Sul de 17 de Fevereiro de 2011,
Proc. nº 7052/10, e de 1 de Junho de 2011, Proc. nº 7302/11.
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