Posição de contrainteressados em sede de anulação do ato de adjudicação (concurso público) – questão controversa da sua legitimidade


Posição de contrainteressados em sede de anulação do ato de adjudicação (concurso público) – questão controversa da sua legitimidade

Segundo uma ideia do direito alemão e do direito italiano, a parte contrainteressada é sempre vista como a parte secundária. O Professor Doutor Paulo Otero defende que se cria uma situação de litisconsórcio passivo, partindo da lei portuguesa, quando se cria o ónus de identificar e citar os contrainteressados (art. 78º/2/b CPTA), senão teremos uma situação rejeição do recurso por ilegitimidade passiva (artigos 154º e 155º CPTA). Esta dupla situação consiste, por um lado, num litisconsórcio necessário passivo entre todos os contrainteressados, em consequência da falta de chamamento ao processo de qualquer um deles, que causa ilegitimidade passiva (artigo 155º/2 CPTA); por outro lado, consiste num litisconsórcio necessário passivo entre a autoridade recorrida e os contrainteressados. De salientar, que o Professor Doutor Vasco Pereira da Silva considera que os contrainteressados são verdadeiras partes no processo, como resulta do final do art. 10º, e dos arts. 57º e 68º/2 CPTA.

Podemos concluir que estamos perante numa nova forma de intervenção processual de terceiros no âmbito do recurso contencioso de anulação. Desta forma, os contrainteressados terão de ser tutelados e, para isso, podemos invocar fundamentos subjetivos e objetivos.
Quanto aos subjetivos, teremos de referir que o contrainteressado é chamado ao processo porque é titular de interesses que podem ser diretamente prejudicados com o provimento do recurso, fica diretamente implicado e associado ao mesmo. Daqui retiramos, desde logo, o direito fundamental de acesso à justiça, consagrado no art. 20ºCRP. Para além deste, teremos de referir ainda o princípio da tutela jurisdicional efetiva, consagrado no art. 268º/4 CRP e no art. 2º CPTA, bem como o princípio do respeito pelas posições jurídicas subjetivas dos administrados, nos termos do art. 266º/1 CRP, devendo ser ambos conjugados com os princípios do contraditório e da igualdade das partes.
Objetivamente, poderemos colocar o problema da decisão que anule um ato, nunca produzirá efeitos de caso julgado relativamente aos contrainteressados que não tiveram a possibilidade de intervir no processo, isto é, terão de ter esta oportunidade de participação, para que esta decisão lhes seja abrangida.

Conseguimos perceber que a possibilidade de intervenção processual dos contrainteressados sugere a existência de uma máxima amplitude de eficácia subjetiva ou da decisão judicial de anulação do ato, sendo necessário conjugar valores como a unidade do sistema jurídico, um exercício mais racional e eficiente da função jurisdicional dos tribunais, como refere o Professor Doutor Paulo Otero.
Quanto à questão da posição dos contrainteressados em caso de anulação do ato de adjudicação no concurso público, podemos assinalar que três tribunais apresentam três respostas diferentes: todos os concorrentes; – tese do TAF de Mirandela; apenas os classificados em melhor posição que o impugnante- tese do TCA Norte; somente o adjudicatário; – tese do STA.
O artigo 57.º do CPTA apresenta duas espécies de pessoas, sendo a primeria delas as que são diretamente prejudicadas pela anulação ou declaração de nulidade do ato impugnado e as que o prejuízo não resulta diretamente dessa anulação ou declaração de nulidade, mesmo que permaneça o seu interesse legítimo na manutenção do ato visto. Olhando para a resposta do STA, percebemos a preocupação existente quanto à prejudicialidade da procedência da ação, recorrendo a um “juízo de prognose numa perspetiva estrita, à luz dos interesses envolvidos pelo ato recorrido”, identificando apenas quem efetivamente poderia ser diretamente prejudicado com a anulação do ato.

O Professor Doutor Mário Aroso de Almeida afirma que o universo deverá ser mais amplo do que a letra da lei nos elucida” de forma a "assegurar que o processo não corra à revelia das pessoas em cuja esfera jurídica ele se propõe introduzir efeitos".
Olhando para o caso dos concursos públicos, todos os concorrentes deverão integrar a categoria de contrainteressados, uma vez que se trata da "subsistência da respetiva graduação no concurso". Devendo ser reconhecida a legitimidade a todos os participantes, podendo estes intervir no processo de subsistência de um ato que lhes diz respeito.

Assim, sendo o ato anulado, todos os concorrentes terão uma oportunidade renovada para que as suas propostas sejam avaliadas, não estando em questão da classificação e escolha das mesmas mas, por outro lado, com a legalidade do concurso em si.
O professor Paulo Otero não concorda com a visão apresentada pelo STA, classificando-a como “uma decisão enferma de inconstitucionalidade e ainda uma inoponibilidade de caso julgado, pois quem não foi chamado ao processo nunca poderá ser prejudicado pela respetiva decisão”.
Desta forma, e concluindo a presente reflexão, todos os concorrentes do concurso público teriam essa legitimidade, partindo do artigo 57.º do CPTA. 


Bibliografia consultada:
. ALMEIDA, Mário de Aroso – Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2017, 3.º edição
COIMBRA, JOSÉ DUARTE, A «legitimidade» do Interesse na Legitimidade Activa de Particulares para impugnação de actos administrativos, Trabalho de oral de melhoria Contencioso Administrativo e Tributário, 2012/2013 págs. 3-4;
. OTERO, Paulo – Os Contrainteressados em Contencioso Administrativo: Fundamento, Função e Determinação do Universo em Recurso Contencioso Final de Procedimento Concursal (Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Rogério Soares), Coimbra Editora, 2001
. SILVA, Vasco Pereira da - O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise - Ensaio sobre as Acções no Novo Processo Administrativo, Almedina, 2016, reimpressão da 2ª edição de 2009


4º ano; Turma A
Armando Henrique Fonseca Reis Vieira 
Nº 57076
Subturma 7

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